De modo basilar, a noção de Terceiro Cinema é fruto da década de 1960 e dos movimentos culturais e sociais que refletiam as profundas transformações pelas quais o mundo passava (Prysthon). Ao refletir cinematograficamente processos de conscientização social e de luta política, é resultado, ainda, de uma concepção terceiro-mundista e de sua luta pelo processo de descolonização.
Trata-se de uma cinematografia composta pelas produções de nações e minorias colonizadas, que, como coalizão política, se uniram ao redor do entusiasmo provocado pelas lutas anticoloniais da Argélia e do Vietnã. Nesse contexto, os filmes buscaram debater a condição de subdesenvolvimento, miséria e fome, ao deixar de lado o exotismo da visão e da forma dominante. A aposta foi um olhar de dentro, capaz de compreender a pobreza e a transformar em uma forma própria.
Basicamente, a produção cinematográfica terceiro-mundista pode ser caracterizada, de um lado, como fruto de concepções técnicas abertas e simples; por outro, como uma veiculação de ideias revolucionárias (Prysthon). A noção de Terceiro Cinema apareceu como um chamamento para os problemas do terceiro mundo e a sua principal referência teórica foi o livro Os condenados da terra (1961), de Franz Fanon. Por conta da ideia de transformação do mundo através do processo de conscientização, os cineastas terceiro-mundistas buscaram seus temas nas esferas marginalizadas da sociedade. E entre os principais recortes temáticos estavam a pobreza, a opressão social, a recuperação da história dos povos colonizados e a constituição das nações.
O termo Terceiro Cinema foi utilizado pela primeira vez nos anos 1960 por Fernando Solanas e Octavio Getino para implicar usos práticos da linguagem cinematográfica como ferramenta de pretensões políticas (Stam; Shohat). Trata-se, além disso, de uma perspectiva que foi cristalizada a partir de uma onda de ensaios-manifestos militantes (Stam): estética da fome (Glauber Rocha, 1965); Em direção ao terceiro cinema (Fernando Solanas; Octavio Getino, 1969) e Por um cinema imperfeito (Julio Garcia Espinosa, 1969). Textos que foram importantes para o projeto unificador de um cinema engajado e que deixaram explícita a ideia de valorização de um cinema alternativo, independente e anti-imperialista.
Esses manifestos tornaram-se importantes ferramentas, e, até mesmo, podem ser tomados como gênese das teorias do cinema latino-americano, por exemplo. Todos apresentam como ponto comum a tentativa, o interesse, de se criar e estabelecer um estilo próprio capaz de transpor imageticamente a condição econômica dos países da América Latina por meio da busca por um cinema de escassez, voltado para as marcas do subdesenvolvimento e da pobreza enquanto fenômenos estruturais no âmbito desse espaço geográfico (Christofoletti).
Do ponto de vista latino-americano, o engajamento político, que se fez presente em filmes brasileiros, argentinos, bolivianos e cubanos, por exemplo, e que ajudou a constituir um imaginário social próprio para a América Latina, baseava-se em questões singulares da realidade histórica de cada um de seus países (Christofoletti). No Brasil, por exemplo, o principal expoente das questões técnicas e políticas colocadas pelo modelo terceiro-mundista foi a trilogia do sertão do Cinema Novo: Deus e o Diabo na terra do Sol (Glauber Rocha, 1964), Os Fuzis (Ruy Guerra, 1964) e Vidas Secas (Nelson Pereira dos Santos, 1963). Obras que, ao refletir cinematograficamente processos de conscientização social e de luta política, apostaram no espaço nordestino como alegoria da condição nacional.